Hoje apresentar-vos-ei algo diferente. Como sabem, Portugal está sob um regime onde pais portugueses apenas podem dar aos filhos nomes que constem da lista de nomes aceites em Portugal. E no Brasil? Será que resultaria? Pedi a quatro participantes do grupo que fizessem, cada uma, um texto onde, de acordo com a sua nacionalidade, defendessem a sua opinião acerca desta tão polémica lista. Elas aceitaram o desafio.
Sou portuguesa e concordo com a existência de uma lista:
Quem conhece os meus gostos sabe que dou preferência a nomes incomuns, raros. Mas ser incomum ou raro não significa que vá humilhar o portador do nome, e isso é um aspecto essencial quando se decide como o bebé se irá chamar. Aquele pequeno ser dependerá maioritariamente dos pais e estará à mercê de tudo. Os familiares vão querer saber como se vai chamar. Vão querer que pelo menos o 2º nome seja o da tão querida bisavó Urgentina. Vão querer que seja o nome que quiseram usar mas não puderam. Vão querer muita coisa, mas não vão decidir nenhuma. Quem escolhe são os pais, seja por influência ou não, mas são eles que escolhem. Portanto a decisão mais importante da vida deles – e da do filho – recai sobre duas pessoas. Cá em Portugal, muitos casais optam por um nome que considerem seguro, que não humilhe ou traumatize o filho, enfim, que seja um nome “normal”.
Mas, infelizmente, há sempre umas pessoas que gostam de ser diferentes, gostam de mostrar que não são iguais aos outros. Digo “infelizmente” porque a maneira como expressam essa vontade de serem diferentes é através do nome do filho. Muita gente escolhe um nome, não porque gosta, mas porque quer apenas dar nas vistas. Ou, mesmo não querendo dar nas vistas – também pode acontecer – não têm noção da situação em que vão colocar a criança. A intenção pode ser das melhores, mas duvido que uma Lyonce Viiktória vá ser muito feliz com o nome que tem. Pode ser feliz, claro que sim, mas não com o nome. Durante muito tempo o nome vai atormentá-la. Um dia pode aprender a gostar dele – que remédio – ou não. Tudo porque os pais quiseram dar um nome com significado que simplesmente não se ajustava. Não percebo a necessidade de complicar as coisas. A vida já é complicada, e ainda complicam com nomes alterados. Lyonce e Viiktória até podem existir no país do Yannick Djaló, mas não foi lá que a menina nasceu. Nasceu em Portugal, onde estes nomes alterados e mal escritos não têm boa fama. Quiseram dar um nome com significado à menina. Só isso não tem mal nenhum, muitos pais dão João ou Inês porque para eles têm significado. Mas se dar um nome com significado implica expôr a bebé a comentários desagradáveis, isso já acho inaceitável.
A polémica à volta de Lyonce Viiktória foi tanta que se criaram sites e vídeos depreciativos (por exemplo, um site onde se pode lyoncificar um nome). Desculpem, isto para mim é falta de bom senso. A bebé, que não tem culpa de nada, mal nasceu levou logo com comentários desagradáveis e músicas a brincar com o nome.
De uma coisa podem ter a certeza: não desisto de um nome só porque os outros não gostam. Isso do gosto é relativo e até variável. Estudamos nomes há tempo suficiente para sabermos os que são usáveis e os que não são. Um menino Gaspar não vai ser gozado por causa do nome. Gaspar é um nome, existe, está na lista, não ofende ninguém. Uma Lyonce Viiktória já não tem esta protecção. Porque é mesmo isso, protecção. Os bebés, nos primeiros tempos de vida, são indefesos. Precisam dos pais e da família para os proteger. Ora, dar um nome que é alvo de chacota nacional não me parece protecção nenhuma. E qual era a dificuldade de escrever Victória? Se os pais não protegem os filhos, alguém tem de o fazer.
A lista existe para proteger as pessoas de nomes ridículos como Nutela, Camião, Vitalis, Asus, Morta, Beringela (sim, já vi pessoas que tentaram registar estes nomes. Surpresa, não podem). Muitas crianças não se safam de nomes alterados e mal escritos, porque os pais - ou pelo menos um deles - lá apresentam a prova da dupla nacionalidade. Não acho mau terem um nome estrangeiro. Acho mau é terem um nome mal escrito, seja estrangeiro ou não. Isso sim é mau.
Por exemplo, conheço o caso da Nicole Fonseca que tem mais liberdade para escolher nomes estrangeiros, graças à nacionalidade do marido que não é português – e como a invejo, porque há nomes não-portugueses que acho uma pena não serem aceites. Nestes casos, a lista é mais flexível mas mesmo assim obriga a que os nomes estejam escritos na grafia correta. Mas pelo que conheço da Nicole, ela nunca seria capaz de dar um nome completamente enfeitado. Acho que há limites, mesmo dentro da liberdade. E muita gente, não fosse a lista, não se preocuparia com isso.
Claro que nem tudo na lista é perfeito. Há muita coisa com a qual não concordo e uma data de critérios que não entendo. Mas isso são os critérios, não a lista em si. Acho que se não houvesse lista, isto ia ser uma mixórdia de temáticas autêntica e íamos ver crianças com nomes ridículos, não há outra palavra para descrever. Acho que é do interesse de toda a gente que isto não aconteça.
Maria Pilar Monteiro.
Sou brasileira e concordo com a existência de uma lista deste género no Brasil:
Eu acho que um pai não tem direito de estropiar o nome do filho ou até mesmo inventá-lo podendo prejudicá-lo posteriormente e fazê-lo soletrar sempre que se apresentar a alguém. Porém não sou a favor da lista do modo como está estabelecida em Portugal, limitando-os demasiadamente de certos nomes que são perfeitamente usáveis em países lusófonos, como por exemplo: Clarissa.
O Brasil é um país multicultural e de diferentes rostos, nossa lista, como espelho de nossa pluralidade, deve ser muito mais ampla, a exemplo da lista da Argentina que se aceita por exemplo Roosevelt, Sonya e Theodore. Também deveria ser incluído os verdadeiros nomes brasileiros, que são os nomes indígenas. Dessa forma, tendo uma lista de permitidos, evitaríamos ver em escolas, faculdades, hospitais e outros lugares que constumamos frequentar, Rikelmes, Kemmillys, Jésykas e entre outros nomes que infelizmente são modificados pelo simples fato dos pais acharem "mais chique" em uma escrita que não é a correta.
Luinara Menezes.
Sou portuguesa e não concordo com a existência de uma lista:
2003 - Altura em que nasceu a minha primeira filha. A primeira vez que tive contacto com essa lista do Inferno ou do Demo, como eu gosto tanto de lhe chamar.
Durante a gravidez eu e o meu marido escolhemos o nome da menina. Seria Samira, quanto a isto não restavam dúvidas. Três dias depois da minha filha nascer, dirijo-me ao Registo Civil para registar a criança. Do outro lado do Balcão:
-Bom dia, então qual é o nome a dar a criança?
-O nome é Samira.
-Ah, esse nome não consta da lista…
-Que lista?
-A lista de nomes autorizados a serem registados. Tome, tem aqui a lista, só pode registar um nome que conste nessa lista!
Nesta altura eu já estava a ferver e as minhas hormonas de grávida/mãe recente já estavam aos saltos. Agarro na porra da lista com umas 80 páginas. Mas como raio ia eu escolher um nome para a minha filha em 5 minutos?! Um nome que leva praticamente uma gravidez inteira de 9 meses a ser discutido, pensado e decidido! Um nome que a minha filha iria carregar para o resto da vida dela!
É de salientar que o meu marido é estrangeiro, em 2003 nem sequer dupla nacionalidade tinha, e ninguém teve a gentileza de nos informar, que sendo o pai estrangeiro, poderíamos ter registado um nome qualquer, nem que fosse Cicciolina! Eu tinha 20 anos, era pouco informada, e assim nos passaram a perna!
Voltando à estúpida da lista: começo a vê-la de alto a baixo e a senhora do registo sempre a olhar para nós do género “vejam lá se despacham isso”. Nesta altura já eu estava capaz de lhe dar dois estalos, só para ela virar a cara para o outro lado.
O meu marido lembra-se de Nadine:
-Gostas de Nadine? Podia ficar esse.
-Gosto, mas é o nome da filha da minha melhor amiga, está completamente fora de questão!
Chego a letra S na lista e deparo-me com o nome Safira, como autorizado a registar. Neste momento já a vontade de dar duas estaladas tinha feito um upgrade para: “capaz de matar alguém”:
-Olhe desculpe lá, porque é que Safira está na lista e Samira não? Afinal é só trocar o F pelo M!
-Ah sabe, eu não sei, faz parte da Lei, mas pode pedir um estudo ao nome Samira, tem é que pagar, e se for aceite já pode registar o nome.
-Ah sim? E se não for aceite, devolvem-me o dinheiro?
-Ah isso é que já não!
-Então eu pago um estudo ao nome, acabo por não pôr o nome e ainda ficam com o meu dinheiro? Não, obrigado!
Em desespero, voltei ao topo da lista, letra A…Andria….o pai chama se Adrian….Fica Andria! Não aguentava mais estar ali dentro, queria sair dali, a minha vontade era pegar fogo àquelas malditas páginas.
2010 - Altura de ter o segundo filho, escolher o nome. Desta vez já não me apanharam desprevenida, já tinha conhecimento da lista do Demo. O meu marido já tinha dupla nacionalidade, e, como tal, todos os documentos dele eram portugueses, nunca mais tratou de documentos do país dele. Para registar um nome não autorizado precisávamos do passaporte do país de origem do pai. Ele, como não quis perder tempo e gastar dinheiro a tratar disso, lá ficámos limitados à maldita lista.
Tomás foi o nome escolhido, eu, pessoalmente, prefiro nomes menos comuns, mas eu e o meu marido não chegámos a acordo em mais nenhum nome, por isso ficou Tomás.
Enquanto consultava as listas para escolher o nome do meu filho, deparei-me com o nome Samira na lista, como estando autorizado a ser registado! Ou seja, passados 7 anos da minha filha nascer, o nome que queríamos para ela já estava na lista! Escusado será dizer que ainda mais raiva ganhei aquela estúpida lista dos Infernos!
2015 - Altura de ter o terceiro filho, desta vez mais uma menina. O meu marido mostrou a revolta que há dentro dele, desde 2003. Nome escolhido? Kayla Samira.
Kayla é um nome não autorizado na lista, mas, por exemplo, Kelly é um nome autorizado. Mas o meu marido revoltou-se ao terceiro filho! Diz que desta vez já não vão gozar com ele, afinal dizem que à terceira é de vez, por isso, o passaporte já está feito, tudo a postos para registar a Kayla. A escolha de Samira deve-se ao facto de ele realmente ser apaixonado por esse nome, em 12 anos não conseguiu esquecer o nome nem o facto de em 2003 ter sido barrado no registo. Pior ficou quando soube que podia ter registado a filha com o nome que ele tanto gostava. Ao fim de 12 anos vai se vingar, além de meter um nome não admitido pela lista dos Infernos ainda vai ressuscitar a Samira, que, para mim, já estava bem lá no fundinho do baú.
São muitas as contradições daquela lista, chegam inclusivamente a estragar as grafias dos nomes, senão vejamos: Jonathan, não se pode pôr, mas Jonatã já podemos. Gael, não podemos pôr, mas podemos por Gaele. Kiara com i (que seria, na minha opinião, a grafia mais correta) não podemos pôr, mas podemos por Kyara, no entanto podemos optar por Yara ou Iara. Enfim. Aisha não se pode, mas pode-se Aixa. Alissa também não, mas Aliça sim. Kevin também não, mas Kévim sim.
Podemos registar uma Isa Mara, mas uma Isamara não. Jade só pode ser usado em segundo nome, pergunto porquê? Se é um nome, qual é a diferença de ser usado em primeiro ou segundo lugar?
Jasmim é considerado nome masculino, pergunto-me quantos homens andaram por essas terras chamados Jasmim.
Mel, outro nome considerado masculino, deve ser por causa do Mel Gibson. Em Portugal um homem chamar se Mel é, no mínimo, muito estranho.
Podemos usar nomes de fruta: Clementina, Romã, Amora…mas Laranja e Cereja já não. Mas então porquê?! Não é tudo fruta na mesma?!
E depois temos nomes admitidos que são de bradar aos céus! Eu pergunto-me se alguém algum dia na vida consideraria usar aqueles nomes num filho! Mas pronto, acho que todos os pais têm o direito de meter um nome que gostem ao filhos, não devem estar limitados a uma lista de nomes. Alguns com grafia bem horrível acabam por estragar o nome. Devia ser possível registarmos o nome que bem quiséssemos (com limites claro) tudo dentro das grafias originais, sem enfeites desnecessários. Usa-se muito no Brasil acrescentar aos nomes Y H K: por exemplo, uma Nicole facilmente pode virar Nykolly, ou uma Samira pode virar uma Sahmyraa e com isso eu não concordo, mas nomes com grafias originais e bem escritos, acho que poderíamos escolher o que gostássemos.
Eu podia continuar aqui a falar das contradições da lista do Demo, mas vou deixar que vocês mesmos consultem a lista e se deparem com todas estas coisas, acreditem, vão-se divertir muito! Claro que não vamos registar um filho com o nome Dancake ou uma filha chamada Evax! Tudo no seu limite, mas por favor, que seja abolida a lista dos Infernos!
Nicole Fonseca.
Sou brasileira e não concordo com a existência de uma lista deste género no Brasil:
A questão sobre o Brasil adotar o uso de lista de nomes permitido sempre é polémica, devo deixar claro que não sou da opinião que os pais possam nomear o filho com qualquer coisa que chamam de nome, mas sou contra uma lista que permita apenas os nomes que ali constem.
Os meus motivos para ser contraria são simples, por ser nosso país imenso e totalmente multicultural, não seria nada fácil a criação desta lista. E a quem ficaria a tarefa de tal criação? Um grande centro que certamente não levaria em conta os gostos do pessoal do interior do país? Ou uma pessoa que acha que somente pode ser usando um nome italiano quem é descendente de tal povo?
Certamente não seria levando em conta as vivências das pessoas, cada região do Brasil é unica e formada por diferente maneira e deve respeitar essas particularidades. Acredito que o que deva ser proibido são erros grotescos que cometem com certos nomes, como substituir Y por i, K por C ou o uso de letras dobradas, ou o acréscimo de letras onde não existem em nenhuma grafia em nenhum outro país, isso já permitiria que pessoas tivessem no mínimo nomes bem escritos.
Karen Ramires.
Aqui deixo dois links importantes que explicam, um pouco, o porquê de existir em Portugal uma proibição para determinados nomes. A origem dessa proibição são motivos religiosos, que abalaram toda uma época. Aconselho muito a leitura.
E, claro a nossa lista, para que possam consultar:
E vocês? Com que participante do blog mais se identificam?