Devo começar dizendo que, muito particularmente, não sou partidária de nomes compostos. Eu sou do tipo de pessoa que pensa que a beleza de um nome deva ser apreciada isoladamente. Contudo isso não me impede de contemplar belos nomes compostos, porque, afinal, o quão enfadonho seria o mundo se todos pensassem como eu?
O grande problema reside no fato de que muitas vezes as pessoas escolhem nomes compostos sem o menor critério, apenas para atender a uma espécie de capricho ou fetiche por nomes duplos ou levados pela indecisão por dois nomes que gostam muito, o que muitas vezes é a catástrofe total e acaba por comprometer belos nomes que teriam sido escolhas bem sucedidas se fossem utilizados sozinhos.
Mas como escolher um bom composto?
Eu diria que devem ser levados em consideração três critérios principais em ordem de importância, e que estão correlacionados. Vamos a eles.
1. Tamanho, tonicidade e fluidez
Na minha opinião (e isto não é um consenso no grupo) o critério mais importante na aceitação de um nome composto é este. O tamanho do conjunto em si, o local em que se situam as sílabas tônicas e a fluidez com que dizemos o nome. Trata-se do critério auditivo, sonoro, musical.
Vamos partir da premissa de que um nome duplo deve ser utilizado inteiramente, e não apenas o primeiro ou o segundo nome (se você não acredita que um nome duplo deva ser completamente utilizado essas dicas não são para você, portanto sinta-se a vontade para ignorá-las ou utilizar apenas a parte que bem lhe aprouver).
Ainda na minha opinião, se um composto induz ao uso de apenas um dos nomes no dia a dia, isso prova a inviabilidade do uso e o insucesso da composição. Por exemplo, se eu nomeio uma criança Maria Olívia, eu quero que ela seja chamada na maior parte das vezes como Maria Olívia, e não só Maria nem só Olívia. Concordam?
Mas o que acontece quando resolvemos batizar a pequena como Selene Morgana? Sejamos realistas. Parece mesmo sensato imaginar que as professoras e as coleguinhas iriam se referir ou chamar a menina pelo nome inteiro?
“- Oi, Selene Morgana, como foi seu fim de semana?”
“- Cuidado, Selene Morgana, você vai se machucar!!”
Ora, parece bem óbvio que apenas um dos nomes será efetivamente utilizado. Ou bem Selene, ou bem Morgana. Os pais e outros adultos vão optar por um dos nomes enquanto ela não se auto determina e a criança pode concordar com isso ou escolher o outro em certa altura da vida. Por outro lado, um nome como Ana Júlia é um nome que com certeza vai ser utilizado em sua completude, ou mesmo composições originais como Cora Lis. Portanto, o tamanho é algo a ser avaliado.
Eu sugiro utilizar um nome de no máximo quatro e em casos específicos cinco sílabas, pois é o limite de paciência que um ser humano parece ter quando se trata de pronunciar nomes alheios. Vejam que Selene Morgana tem seis sílabas, mas apenas pronunciamos cinco. (Sim, cinco!). Retornarei a esse mesmo tópico alguns parágrafos abaixo para explicar melhor como isso acontece.
Voltando a falar sobre tonicidade, vamos recordar de que quando somos crianças aprendemos a separar sílabas, as sílabas gramaticais. Muitos faziam isso batendo palmas, assim aprendemos que um nome não é uma partícula única, mas sim formado por pedaços menores chamados sílabas. Aprendemos quando um nome é monossílabo, dissílabo, trissílabo e polissílabo.
Mais tarde aprendemos sobre sílabas oxítonas, paroxítonas e proparoxítonas. Sendo as oxítonas as que tem a sílaba tônica (a sílaba mais forte da palavra) na última sílaba, as paroxítonas as que tem a tônica na penúltima sílaba, e as proparoxítonas na antepenúltima. (Obs.: Se você tem dúvidas sobre qual é a sílaba tônica de determinado nome, experimente chamar o nome. Ex. jo-A-naaaa - sendo o “A” a sílaba tônica do nome Joana).
Uma vez que você descobre a sílaba tônica dos nomes que pretende colocar juntos, experimente escrevê-los e circular as sílabas tônicas. As sílabas tônicas são cruciais para determinarmos a fluidez de um nome.
Mas o que é a fluidez?
A fluidez é a característica de unicidade, conjunto, principalmente sonora do nome. Por exemplo, voltando a Selene Morgana. Não é um composto ruim (veja bem, são dois nomes lindos!) só não é um composto fluídico. Não se consegue “cantar o nome” de uma só respiração. É um nome muito longo. Mas por que temos essa impressão com Selene Morgana e não com Patrícia Amélia (outro composto com seis sílabas)?
Eu tenho uma teoria de que um nome deve ter idealmente três e não pode passar de quatro sílabas, caso contrário se torna desarmônico. Mas não são as sílabas gramaticais das separações de sílabas que falamos anteriormente. São as sílabas poéticas, aprendidas nas aulas de literatura, quando atingimos a adolescência. As sílabas poéticas são elementos utilizados em poesias e músicas para conferir ritmo e a desejada cadência dos versos (versificação). Atentar para as sílabas poéticas ajuda a entender sobre fluidez. Veja o exemplo:
Sílabas dos versos (gramaticais):
"Ah!/Quem/ há/ de/ ex/pri/mir/, al/ma/ im/po/nen/te/ e/ es/cra/va" (Olavo Bilac) - 17 sílabas gramaticais.
Sílabas poéticas:
"Ah!/ Quem/ há/ de ex/pri/mir/,al/ma im/po/nen/te e es/cra/va" (Olavo Bilac) - 12 sílabas poéticas.
(Para quem não entendeu porque são doze sílabas e está quebrando a cabeça, saiba que as sílabas poéticas só são contadas até a última sílaba tônica, no caso “cra”).
Agora veja:
A/na/ Jú/lia (3 sílabas poéticas)
Se/le/ne Mor/ga/na (5 sílabas poéticas)
Pa/trí/cia A/mé/lia (4 sílabas poéticas)
Mor/ga/na E/lis (4 sílabas poéticas)
Perceba que o “cia e o “A” e o “na” e o “E” se fundem numa sílaba só, portanto quatro sílabas poéticas nos dois últimos exemplos)
Nem precisa dizer qual desses quatro exemplos é desarmônico, não é?
O que concluímos disso é que as melhores composições virão provavelmente de nomes que mesclem elementos:
a) Monossílabos com dissílabos, trissílabos ou polissílabos (três, quatro ou cinco sílabas)
b) Dissílabos com dissílabos ou trissílabos (quatro ou cinco sílabas)
c) Trissílabos com monossílabos ou dissílabos (quatro ou cinco sílabas)
d) Polissílabos com monossílabos ou dissílabos (apenas em casos muitíssimo especiais em que o limite das 4 sílabas poéticas continuem respeitadas)
Sobre esse último caso, esquecendo todas as influências de gosto, apenas para mera exemplificação temos Esmeralda Cloé versus Cloé Esmeralda. Já aprendemos a separar sílabas poéticas, então teríamos:
Es/me/ral/da/ Clo/é (6 sílabas poéticas)
Clo/é Es/me/ral/da (4 sílabas poéticas)
Para provar o que digo, experimente dizer o nome em voz alta e entenda o que é fluidez. Perceberam que nesse último exemplo saímos de um composto inviável e “quebrado”, desarmônico para um composto fluído e possível? Isso acontece porque quando invertemos a posição, a sílaba tônica que permitia a fluidez do composto encontra um elemento de junção na sílaba átona posterior, reduzindo o número de sílabas poéticas.
Isso acontece quando vogais se encontram, sejam elas iguais, como no exemplo, o que chamamos de crase ou sejam elas diferentes, ou seja, elisão. Por isso, se quer um composto com um nome polissílabo procure um que possua vogais no começo ou final e junte com um monossílabo ou dissílabo que também as tenha, formando uma crase ou elisão no meio do composto (e atentando sempre para a última sílaba tônica).
Você vai perceber que geralmente só vai conseguir esse efeito se o monossílabo ou dissílabo oxítono terminado em vogal vier antes do polissílabo paroxítono ou proparoxítono.
Clo/é Es/me/ral/da ( 4 sílabas poéticas/ dissílabo + polissílabo paroxítono)
Lis/ Per/sé/fo/ne (3 sílabas poéticas/ monossílabo + polissílabo proparoxítono)
2. Significado
Outro critério a que devemos nos atentar antes de nos decidirmos por um nome tem relação com o seu significado. Não é o critério mais importante pra mim, que adoro o nome Ulisses que muitos continuam a associar com o significado “ódio”. A única coisa que quero chamar atenção nesse ponto, e não quero me demorar, é de que alguns nomes mudam de sentido quando juntamos o segundo. Por exemplo, Maria Luiza. Maria significa rainha soberana, e Luiza significa guerreira. Quando juntamos os dois temos “guerreira soberana”. O mesmo não ocorre em Maria Cecília. Cecília por si só já tem um significado pesado: cega (não que eu fosse me importar, Cecília é um nome que amo). Maria Cecília poderia significar rainha cega, ou rainha dos cegos. Se for algo que importe a você, certifique-se de que a junção dos significados dos compostos que pretende usar não gere aberrações etimológicas e siga feliz. Ou não.
3. Temporalidade e estilo
Também não vou me demorar nesse tópico porque isso já é exaustivamente discutido em cada postagem sobre qualquer nome que discutimos. Só o que quero apontar é que é importante ter idéia sobre a temporalidade do nome que se pretende juntar a outro. Muitas pessoas ignoram o fato de que alguns nomes são datados de algumas épocas enquanto outros são mais modernos e outros ainda atemporais, clássicos. Não funciona tentar um composto como Sônia Valentina (só um exemplo, esquecendo tudo que falei antes sobre métrica e versificação), porque Sônia é um nome datado e Valentina é um nome vintage, repaginado. Há também quem prefira combinar pelo contraste, o que eu totalmente aprovo pois sugere equilíbrio, como um nome básico e outro um pouco mais extravagante, um clássico/atemporal e um moderno e fresco. Tudo isso é possível, apenas mantenha o bom senso. Estropiações serão totalmente repudiadas.
4. Conselhos adicionais
Procure prestar atenção também a elementos cacófatos no composto desejado. Por exemplo Luca Gabriel (apontado no grupo) em que o encontro da sílaba final do primeiro nome com a inicial do segundo nome gerou um som no mínimo constrangedor. Os cacófatos podem ocorrer também entre o final do nome e o começo do sobrenome e entre os dois sobrenomes. Também atente para a repetição de significados, como Maria Miriam (sendo que Miriam é uma variante de Maria, tendo como resultado Maria Maria) ou a repetição de sons como em Ari Ariel, ou mesmo a rima como em Maria Sofia ou Rui Simão Leão (no caso, Leão como sobrenome). Procure evitar também sibilos nos encontros dos nomes, como Felícia Isabel (sissa) e nomes do tipo “trava-língua” com várias consoantes iguais nos dois nomes.
Lembre-se: é o seu filho, não é um personagem, nem um bichinho de estimação nem um brinquedo. Escolha os nomes deles com cuidado para evitar futuros aborrecimentos.
Espero ter sido útil.
Abraços, Samara Nogueira.
Adorei as dicas e... adoro Felícia Isabel :p
ResponderExcluirSamara, gostei imenso! Parabéns! Está extraordinariamente informativo e bem conseguido.
ResponderExcluirSó não concordo com a generalização do "se um composto induz ao uso de apenas um dos nomes no dia a dia, isso prova a inviabilidade do uso e o insucesso da composição". Eu posso criar um composto harmónico e mesmo assim pretender utilizar apenas um dos nomes por opção e não por inviabilidade. Mas entendo a forma e o porquê de ter sido introduzido no texto.Sem dúvida vou ter outro cuidado a imaginar compostos :)
Eu simplesmente amei esse post. Excelentes dicas. Parabéns!
ResponderExcluirExcelente trabalho, de mestre! Está de parabéns... Muito minucioso, elucidativo... Trouxe-nos detalhes e sutilezas sobre os quais eu jamais teria pensado...
ResponderExcluirConcordo com vc Samara, tb não sou muito fã de compostos e acho q eles só devem ser utilizados quando os dois nomes "se unem", ou seja, formam praticamente um nome só, a pessoa pode perfeitamente ser chamada pelo composto q soará como um nome. Fora isso, não vejo sentido em se usar um nome composto, tipo, juntar dois nomes q nada tem a ver um com o outro só pra se dizer q tem um nome composto, acho super cafona. Fica parecendo uma pessoa com uma blusa e uma calça com estampas diferentes, ou seja, nada combinando com nada. Ah, Selene Morgana rendeu, hein? Kkkkkkkk!!!
ResponderExcluirMARAVILHOSO
ResponderExcluirExcelente!
ResponderExcluir(Praticamente) de acordo com tudo! E sou uma amante dos nomes compostos :)
Obrigada pelas dicas Samara! Adorei o post :D Parabens!
ResponderExcluirAmei o post! Não que concorde com ele de todo, mas está irrepreensível.
ResponderExcluirTambém gostei muito do texto, Samara! Parabéns!
ResponderExcluirAdorei o post, realmente muito bom e completo! Sempre concordei com a ideia de não dar nome composto quando é para chamar só um nome. Estou tentada a quebrar essa "regra" por um simples motivo: Se eu vou dar um nome raro, não é melhor dar um outro nome também para a criança poder escolher no futuro?
ResponderExcluirAcho que essa é uma escolha muito particular dos pais, mas minha opinião é: se o nome for raro, diferente e fizer parte de um composto, não pode ficar ofuscado por um nome forte, mesmo que seja conhecido. Nesse caso eu sugiro que se opte por um nome neutro e clássico + nome raro. Expls: Luís Ravel, Pedro Índigo, Serena Lis, Maria Lua. Espero ter ajudado :)
ExcluirOlá Samara,tudo bem?
ResponderExcluirO que você acha do nome composto José Belmiro? É desarmônico? Queria dar esse nome ao meu filho que nascerá em Setembro.
Rogério Dantas
Olha que legal, entrei nessa postagem hoje para mostrar para um amigo, que coincidência! Acho José Belmiro um nome lindo, bem clássico. Quanto às sílabas poéticas está no limite: 4 síladas. Nesse caso as pessoas decidem chamá-lo por José, ou Belmiro ou ambos :)
ExcluirGrato Samara, no caso de ser só Belmiro, combinados com o sobrenome? Belmiro Reis é mais sonoro.que José Belmiro? Estou em dúvida que nome dar.
ExcluirRogério
Olá, os dois são escolhas acertadas. Tanto José Belmiro quanto Belmiro Reis soam bem, apenas que, em caso de nome simples não se aplica a "regra" do post. Obrigada pela estima :D
ExcluirOlá Samara. Congratulações pela clareza das exposições do "post" e pelo "blog". Eu e minha esposa estamos na espera de uma doce bebezinha. Gostamos de nomes compostos, e, notadamente, para dar mais personalidade a nomes mais populares. Penso muito em "Laura Helena", como uma junção possível e radicada no contraste das origens latina e grega, berços de nossa civilização ocidental. Soa-me algo calcado na racionalidade do Direito romano e na expansividade da Filosofia grega.
ResponderExcluirGostaríamos muito que nos desse um parecer (talvez técnico, mas também pessoalizado, sobre essa possibilidade de nome composto. Parece-nos que não são quebradas as regras da tonicidade, fluidez e tamanho. O significado igualmente não seria impraticável.
Gratos.
Gosto tanto de Laura quanto de Helena e os dois nomes, juntos, num primeiro momento não me fazem pensar em nenhum problema grave na junção, já que as sílabas estão dentro da métrica. A única atenção que eu tomaria seria à repetição da letra L no composto, que será lido como "laurelêna" e para alguns pode soar quase como um trava-línguas (eu discordo). Se não incomodar ao casal, sigam em frente. A mim não incomoda de modo algum porque eu sou, particularmente, uma fanática por nomes que contém a letra L no meio e por isso tendo a gostar de nomes como ulisses, penélope, donatella e assim por diante.
ExcluirDe toda forma, por mais que os nomes caibam na métrica é provável que, neste composto, as pessoas irão optar por chamar a pequena por apenas um dos nomes, pra facilitar. É assim no Brasil, e, não sei de onde vocês são, acredito que de Portugal, mas não sei até que ponto as pessoas sejam preguiçosas como nós para chamar as pessoas pelo prenome completo - chamamos Manuelas de "Manu", Gabrielas de "Gal", Larissas de Lalá ou Lari e etc.
Apenas levem isso em consideração, mas, insisto, sigam o coração de vocês na escolha, porque todo e qualquer nome será desagradável sob o critério de alguém, já que gosto é subjetivo.
Se convier, podem jogar no lixo tudo o que eu falei aqui, inclusive.
Mil abraços e obrigada por lerem e julgarem minha mera "opinião" importante.
Tenham uma boa hora, quando a bebê chegar.
Muito interessante e elucidativo! Gosto muito de nomes como Flor e Mar comi segundo nome, mesmo quebrando estás regras métricas pois são homenagens à natureza e também acho bonito homenagens a pessoas especiais como avós em compostos. Este carinho à memória de alguém emociona-me.
ResponderExcluirParabéns, amei o texto. Concordo com a ideia de que nome composto só faz sentido quando se utiliza os dois como: Ana Beatriz, João Miguel entre outros, aliás os únicos compostos que pra mim funcionam são os compostos com Maria, Ana, João, José e Luis justamente porque são os que permitem utilizar ambos os nomes como se fossem um. Meu nome é composto e eu amo meu nome, mas é aquela coisa se eu tirar o meu segundo não vai fazer diferença uma vez que noventa e nove por cento das vezes as pessoas utilizam apenas um nome em raras exceções os tios que chamam pelo composto.
ResponderExcluirA maioria das pessoas de minha geração possuem nomes compostos confesso que eu achava estranho (sentia até pena) quando via uma pessoa com um nome único. De uns tempos pra cá eu prefiro compostos do jeito que comentei acima quando se usa ambos como se fossem um só, se não for assim me agrada muito mais um nome único.
A titulo de curiosidade meu segundo nome é Vanessa.
Amei essa postagem. Samara vc acha que Liz/Lis Violeta soa harmônico?
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